O André já havia nos falado dessa travessia entre as praias de Grumari e do Perigoso pelo costão, passando pelas praias mais bonitas da cidade maravilhosa. E sempre que passávamos por ali, para escalar em Guaratiba, pensávamos em fazer essa travessia. Então, assim que ele nos chamou para a empreitada, não pensamos nem meia vez, e já arrumamos nossas mochilas para conhecer um dos locais mais bonitos do Rio de Janeiro. O André estava ansioso também, pois voltaria lá depois de 20 anos.
Existem trilhas para acessar as praias “selvagens” a partir da rodovia entre Grumari e Guaratiba, que passam pelo Parque Natural Municipal de Grumari e pelo Parque Estadual da Pedra Branca, mas ir pelo costão é mais bonito, com muito visual, e é claro, junto com André e Alexandre, não é apenas uma caminhada: tem que levar todo o equipamento de escalada e estar preparada para possíveis e inevitáveis roubadas… Deixamos o carro do André (The Flash II) em Guaratiba, para pegá-lo no final da caminhada, enquanto o nosso carro, o Unão Rover, ficou em Grumari, onde iniciamos a travessia.
Fomos no dia 06 de julho 2013 e no primeiro costão, a primeira surpresa: milhares de canela-de-ema-branca floridas (Vellozia candida). Lindas, tiramos várias fotos. A travessia, em sua maior parte, é só visual, para frente víamos as praias selvagens que iríamos encontrar e para trás, víamos a Pedra da Gávea ao fundo e outras belas praias cariocas e montanhas. Em alguns trechos expostos, com o mar batendo forte no costão lááá em baixo, precisamos usar a corda para garantir a segurança de todos. Em outros trechos, tivemos que varar mato com espinhos assassinos e caraguatás ferozes, nada além do que já estamos acostumados.
Em um certo momento, no meio do costão, o André abriu a mochila para guardar os óculos, com medo que caísse costão abaixo. Um pouco afastados, escutamos um “pin” ao longe, e xingamentos, cada vez mais perto. Resultado: tivemos que mudar a estratégia tão bem elaborada com os carros em cada ponta da travessia, pois a chave do “The Flash II” agora jaz em algum ponto do Oceano Atlântico, depois de cair pelo costão interminável… ok, não íamos mais até a praia do Perigoso para subir para Guaratiba, e sim teríamos que abandonar a travessia na Praia do Meio, onde tínhamos que pegar a trilha para retornar à Grumari, e pegar o Unão Rover (é… sabia que alguma roubada ia ter). Mas até chegar a Praia do Meio, encontraríamos outras surpresas pelo caminho.
Dentre as surpresas pelo caminho, os meninos conquistaram uma via, a Chaminé Rapidinha (II grau, 15 m), tomamos banho de ofurô, banho de mar e eles aproveitaram para trocar um grampo podre com mais de 20 anos, que estava no meio de um costão (!!!!!). (grampo é um tipo de proteção fixa de metal, cravada em um buraco na rocha, aberto com talhadeira ou broca, e serve para fixar o mosquetão e passar a corda, protegendo o escalador).
Enquanto esperava eles trocarem o grampo, deu o horário de aplicação da minha insulina (de ação) lenta. Eu me encontrava no meio do costão rochoso, seguramente o mais exposto da travessia, em cima de um platôzinho de mato, dando segurança para eles e lááá embaixo, o mar azul, e pensei “Mas que lugarzinho para aplicar a insulina… com certeza serei a única no mundo a aplicar insulina aqui…se me virem nessa situação, muita gente vai achar que sou louca (e obviamente eu não sou)…. tenho que registrar isso…” Esperei mais uns 8 minutos pelos meninos e pedi para tirarem uma foto. Assim surgiu a primeira foto da minha coletânea de fotos de insulinização e dextro (procedimento para a medição da glicose) em lugares “pouco usuais”, o que gerou, após a documentação de outras doces aventuras, a ideia do InsulinAção!
Apesar de comer barrinhas de frutas de tempos em tempos, na trilha para voltar à Grumari, que tinha subida mais empinadinha (= mais esforço físico), logo senti os sintomas da hipoglicemia: comecei a andar cada vez mais devagar e a tremer. Nem medi a glicemia, e logo parei, coloquei uma barra de frutas inteira na boca e peguei algumas balas, que sempre levo para casos mais urgentes. Caminhando e comendo, até voltar ao normal e poder caminhar mais rapidinho novamente, e quando sentia que ia começar a baquear novamente, comia mais uma ou duas balinhas, e segui assim até terminarmos a trilha, quando já estava me sentindo melhor. Realmente, não é a melhor maneira de administrar as hipoglicemias eventuais nas trilhas, mas com certeza, continuarei levando as balinhas na mochila, pois podem me tirar de uma bela encrenca (ou melhor, tirar os meus companheiros de uma bela encrenca!). Com a atividade física mais ou menos intensa, e com minha “habilidade” de reconhecer as hipoglicemias, considero que tive um bom controle da glicemia, como mostrado no gráfico, mesmo com poucas medições durante o dia.
No dia seguinte, fomos resgatar o “The Flash II”, e aproveitamos para pegar uma bela praia em Grumari. Os meninos, fissurados, aproveitaram para conquistar mais uma via, na praia, a Efeito Colateral (fenda de VI grau, 20 metros, com direito a maribondos e muita pedra solta).
Beijos e até o próximo pico!